O recém-empossado ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, herdou de seu antecessor, Flávio Dino, uma pasta com a política de controle de armas ainda em formatação e com a Polícia Federal sem estrutura para receber os CACs (colecionadores, atiradores desportivos e caçadores).
Adicionalmente, a nova administração chega com uma promessa não concretizada da anterior: o Recompra. O programa está previsto no novo decreto de armas e tem o intuito de estimular a população a entregar voluntariamente suas armas em troca de compensações financeiras.
Segundo o cronograma do governo federal, a responsabilidade pelos CACs, clubes de tiro e lojas de armas será integralmente da PF a partir de 1° de janeiro de 2025. Atualmente, a atribuição é do Exército.
Com o propósito de concretizar essas mudanças, o diretor da Darm (Divisão Nacional de Controle de Armas) da PF, delegado Humberto Brandão, afirmou que uma minuta está sendo encaminhada nos próximos dias para análise pelo Ministério da Justiça, que aborda mudanças para receber os CACs. Atualmente, há 1,3 milhão de armas nas mãos desse grupo.
A mudança precisa ser feita por meio de decreto, cujo texto será submetido ao Planalto.
A intenção é que a Darm seja elevada ao status de coordenação-geral e tenha várias divisões sob sua jurisdição. Para a estrutura da PF nos estados e no Distrito Federal, o órgão pleiteia uma cisão da Deleaq (Delegacia de Controle de Armas e Produtos Químicos), na de Armas e na de Produtos Químicos.
O órgão também pede 180 cargos de chefia, entre os quais de coordenador e de chefe de núcleo. Para suprir essa demanda rapidamente, a intenção é terceirizar os serviços e abrir concurso público administrativo, que leva menos tempo para formar o profissional.
“Impossível trazer os CACs com essa estrutura, pode colapsar”, disse Brandão. “A ideia é melhorar a estrutura nas pontas. Quando você cria um organograma, você especializa a mão de obra, especializa a prestação de serviço e facilita o controle e o atendimento ao público.”
Especialistas avaliam que o governo federal avançou no controle de armas. Em 2023, em comparação ao ano anterior, a PF registrou uma diminuição de 76% nas autorizações para a aquisição de armas destinadas à defesa pessoal.
No Exército, houve uma redução de 60% nas concessões de armas para CACs no mesmo período. As Forças Armadas esclareceram, por meio de nota, que os pedidos liberados em 2023 correspondem a solicitações de 2022.
Segundo Natália Pollachi, gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, há uma política de controle de armas mais responsável e coerente com a realidade brasileira, destacando os índices de violência armada e a atuação do crime organizado.
Entretanto, indica que ainda é necessário progredir, especialmente no que diz respeito à retirada de novas armas de circulação. Prometido por Dino, o Recompra ainda não saiu do papel.
“Os valores precisam ser atraentes para que as pessoas entreguem armas novas e mais potentes, especialmente fuzis, pistolas, assim elas não acabam migrando para o mercado ilegal”, disse.
Auxiliares de Lewandowski disseram à reportagem que o novo titular da Justiça se comprometeu com o antecessor a dar continuidade às iniciativas até aqui implementadas pelo governo Lula.
Ponderam, no entanto, que ainda haverá uma avaliação sobre a viabilidade do Recompra para este ano, inclusive diante das restrições orçamentárias impostas ao Executivo.
Especialistas enfatizaram que é prematuro afirmar que a atual política governamental já gerou impacto na redução nos crimes violentos letais intencionais, como homicídio, perspectiva explorada por Dino em seus últimos dias como ministro da Justiça.
Na visão de Daniel Cerqueira, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), existem outros fatores que condicionam o número de homicídios, como facções criminosas, questões demográficas, sociais e econômicas.
“Quando se tem menos armas, há uma maior chance de ter menos crimes, o mérito é correto. Entretanto, a gente não pode precisar que vai acontecer neste momento, porque existem outros fatores que podem afetar a dinâmica de homicídios”, disse.
Cerqueira e outros especialistas ouvidos pela reportagem atribuem a queda de 4% dos crimes violentos letais intencionais no Brasil em 2023 em relação ao ano anterior a diversos fatores, entre os quais as políticas regionais adotadas de combate à violência, um “apaziguamento” do conflito entre facções criminosas, que estão se organizando melhor e reduzindo disputas, além de questões demográficas.
Roberto Uchôa, especialista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, diz que é possível afirmar que há uma redução na entrada de novas armas em circulação. Contudo, destaca que o armamento adquirido por cidadãos comuns durante o governo Jair Bolsonaro (PL) permanece presente no cenário atual.
“O maior problema é que, mesmo que você diminua o número de armas de fogo que estão entrando em circulação, o estoque de quase 2 milhões vai ficar até ter um programa robusto de recompra, o que não foi feito até agora”, disse.
Atualmente, vigora o programa Desarma, iniciativa do Ministério da Justiça e Segurança Pública que recompensa com até R$ 450 aqueles que entregam armas voluntariamente. Em 2023, o programa registrou a entrega de 9.561 armas, o menor índice da série histórica desde 2011.
Membros da pasta tentam entender os motivos que levaram a esse declínio, mas dizem acreditar que pode ter relação com o maior controle.
Por Bahia Notícias
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