Altos Papos

Cuba vota legalização do casamento LGBT, neste domingo

A Cuba decidirá, neste domingo (25), através de votação popular, a aprovação de uma norma que legaliza o casamento LGBTQIA+ e outras medidas como proteção das mulheres em casos de violência de gênero doméstica e a liberação da barriga de aluguel, por exemplo. O referendo visa atualizar o Código de Família, que data de 1975.

Em 60 anos de regime, esta é o terceiro referendo, no país. Oito milhões de cubanos estão habilitados a votar, pouco mais de um ano depois de manifestações históricas contra a ditadura, ocorridas 11 de julho de 2021. Brutalmente reprimidos, os atos pediam mudanças amplas no sistema de governo da ilha e reformas econômicas, além de maior participação política.

Como será a votação

Os cidadãos devem ir aos centros de votação entre as 6h e 19h. Durante toda a semana, apenas os cubanos que vivem no exterior e que estão “em missões diplomáticas e de trabalho” tinham direito a votar antecipadamente, de acordo com documentos publicados pelo Conselho de Estado.

Em todos os casos, os cubanos responderão à pergunta: “você concorda com o Código de Família?”

Veja os pontos mais significativos do novo código

Casamento entre pessoas do mesmo sexo

Se o “sim” vencer, Cuba se tornará o nono país da América Latina a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, depois de Argentina, Chile, Uruguai, Brasil, Colômbia, Equador, Costa Rica e México.

No código anterior, o texto se refere ao casamento como “a união voluntária e acordada entre um homem e uma mulher”. O novo texto nomeia-o como “a união voluntária e acordada entre duas pessoas com capacidade jurídica para o casamento, a fim de unir as vidas com base no afeto mútuo, no amor e no respeito”.

Juntamente com essa disposição, o novo código familiar reconhecerá uma gama diversificada de filiações que transcendem a consanguinidade.

Fim do casamento infantil

O código de 1975 permite a possibilidade excepcional de formalizar um casamento infantil com o consentimento dos pais, “desde que a mulher tenha pelo menos 14 anos e o homem tenha pelo menos 16 anos”, conforme indicado no texto original. Já o novo projeto afirma que “a capacidade das pessoas formalizar o casamento é atingida aos dezoito (18) anos de idade”.

O casamento infantil priva as meninas de viver plenamente a infância e põe em risco as suas vidas e saúde, de acordo com a Unicef. Além disso, as jovens que se casam antes dos 18 anos correm maior risco de violência doméstica e têm menos probabilidade de continuar na escola.

Disposições contra a violência baseada no gênero

O novo código reconhece episódios de discriminação e violência na família e afirma que eles “constituem expressões de violência familiar, abuso verbal, físico, psicológico, moral e sexual, econômico ou patrimonial, negligência, desatenção e abandono, quer por ação ou omissão, direta ou indireta”.

Além disso, afirma que são “questões urgentes” e que são, por consequência, devem ser tratadas com prioridade. “Qualquer pessoa que se considere vítima tem o direito de denunciar e solicitar uma proteção imediata das autoridades correspondentes”, diz um dos artigos que serão votados neste domingo.

Barriga de aluguel

Nomeada no novo texto como “gestação solidária” e popularmente conhecida como barriga de aluguel, a maternidade de substituição pode colocar Cuba na lista restrita de países que a reconhecem. A prática é amplamente questionada pelos seus inerentes conflitos éticos.

O novo código, no entanto, apresenta uma série de condições para se aplicar a barriga de aluguel, incluindo que ela deve acontecer por razões altruístas e de solidariedade humana, e não pode ser mediada por qualquer “compensação, presente ou outro benefício”.

Adesões e rejeições ao projeto

O texto e a sua aprovação foram objeto de uma intensa campanha das autoridades cubanas, que inundaram as redes sociais com as hashtags #CodigoSi e #YoVotoSi.

“O Código de Família é a esperança de milhares de pessoas marcadas por histórias dolorosas de exclusão e silêncio. Seres humanos que sofreram e sofrem com os vazios de nossas leis. No dia 25 de setembro, votarei Sim. Para eles e para Cuba”, tuitou o presidente Miguel Diaz-Canel dias antes do referendo.

“Voto Sim para um código que garanta o bem-estar e a felicidade de todos os indivíduos e famílias. Voto Sim para uma regra que reconheça crianças e adolescentes como o tema de direitos #YoVotoSi #CodigoSi”, escreveu a congressista Mariela Castro Espin, filha do falecido Raúl Castro, sexóloga e diretora do Centro Nacional de Educação Sexual (Cenesex).

No entanto, as vozes contra o referendo foram ouvidas e poderiam ser expressas neste domingo pelo “não” ou com a abstenção. No dia 12 de setembro, a Igreja Católica em Cuba emitiu uma carta assinada por um grupo de bispos na qual expunha “com desilusão”, a incorporação no código de uma série de propostas que afirmam serem “notoriamente questionadas por parte da sociedade” e “controversas na maior parte do texto”. Além disso, a carta rejeita os elementos derivados do que define como “ideologia do gênero”.

Na ausência de pesquisas confiáveis, a falta de cobertura por parte dos meios de comunicação social da oposição e a escassa presença de organizações internacionais, os resultados da votação deste domingo continuam incertos. Mas os especialistas preveem que a rejeição do novo texto possa ser utilizada pelo Estado como argumento a favor do funcionamento das instituições democráticas cubanas.

Foto: Ramon Espinosa/ AP