A decisão do presidente Jair Bolsonaro (PL) de conceder o perdão ao deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) teve aval dos militares do governo e foi costurada pelo núcleo bolsonarista raiz do presidente – na contramão do que aconselhou o Centrão.
Bolsonaro, a princípio, tinha sido aconselhado a deixar a saída para o caso Silveira para o Parlamento: ou seja, pressionar Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, a salvar politicamente o mandato do deputado uma vez que, juridicamente, ele já estava condenado à prisão, mas os parlamentares poderiam questionar junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) a decisão sobre o mandato.
A Câmara chegou a acionar o STF, mas Bolsonaro saiu do roteiro e aderiu ao “núcleo duro” de assessores: foram encarregados de achar a solução do decreto concedendo a graça a Silveira
- o subchefe de Assuntos Jurídicos do governo, Pedro Cesar Sousa;
- o secretário de Governo, Celio Faria;
- o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Jorge Oliveira – indicado por Bolsonaro e considerado praticamente da família Bolsonaro;
- e o Advogado-Geral da União, Bruno Bianco.
Fora Bianco, todos são bolsonaristas raiz.
O Centrão, que tenta vender a imagem de um Bolsonaro “moderado”, foi vencido no argumento de que a decisão levaria a uma nova crise institucional com o STF.
E mais: a decisão foi costurada no pior momento de briga de espaço entre o Centrão e militares, já que Braga Netto, que deve ser confirmado na vice de Bolsonaro, voltou a despachar do Palácio do Planalto e tem brigado para retomar poder e protagonismo dos militares junto ao presidente – ou seja, trava uma “guerra” com o centrão.
Esses militares que trabalham para o governo, segundo o blog apurou, não só deram aval como comemoraram a decisão do presidente.
São, também, entusiastas do enfrentamento de Bolsonaro com o Judiciário: além da decisão de quinta-feira (21), também patrocinaram as investidas de Bolsonaro contra as urnas eletrônicas.
Entre os militares, eles explicam os motivos. Há uma certa raiva do STF por ter
- liberado a candidatura do ex-presidente Lula, ao anular decisões da Lava Jato;
- liberado áudios do Superior Tribunal Militar da época da ditadura.
A decisão do STF é de 2017 mas, na semana passada, trechos desses áudios em que os militares comentam os casos de tortura sofridos por presos durante o regime vieram à tona, após um trabalho do historiador Carlos Fico divulgado pela jornalista Miriam Leitão.
Nos bastidores, generais se dizem irritados com a “retomada do assunto”, pois acham que prejudica a imagem das Forças Armadas. No entanto, não entram no mérito do conteúdo dos áudios – que provam as torturas cometidas durante o período da ditadura militar.
Diante desse quadro, militares voltaram a defender que Bolsonaro “enfrente o Judiciário” e aproveitaram o gancho do caso de Daniel Silveira. Um general disse ao blog que o presidente aproveitou para “marcar posição e mostrar limites” para a Corte – e que “duvidava” que o STF venha a derrubar o decreto do presidente.
Reação no STF
Ministros do STF ouvidos pelo blog chamam de “inusitada” a decisão – mas legal. Afirmam, também, que a principal preocupação institucional é manter a inelegibilidade de Silveira – que é “inequívoca”, além da perda de mandato – apesar de o Congresso querer deliberar sobre o assunto.
Do ponto de vista jurídico, ministros se dividem sobre derrubar o decreto: alguns avaliam que é possível costurar uma decisão para derrubar a decisão, outros acreditam que isso daria mais munição a Bolsonaro para dizer que o Judiciário interfere no Poder Executivo.
Ministros também querem aguardar para saber qual o perfil do relator que será encarregado de analisar pedidos da oposição contra o decreto. Se, por exemplo, for um ministro que votou contra o indulto concedido Michel Temer em 2019, alguns integrantes da Corte acreditam que o decreto pode ser suspenso até por liminar.
De toda forma, o STF vai discutir o assunto a partir de segunda-feira (25), após o feriado. Alguns integrantes da Corte defendem que o tribunal divulgue uma posição única sobre a decisão de Bolsonaro.
Na avaliação política, ministros da Corte veem no movimento de Bolsonaro um “truque jurídico” mirando o “jogo eleitoral” e, mais uma vez, levantando a sua bandeira de “qualificar seus inimigos”, o Judiciário, no ano eleitoral.
Por G1