Gênese da corrupção investigada pela Lava Jato do Rio, segundo procuradores, a Secretaria Estadual de Obras do RJ viveu anos subjugada por uma organização criminosa especializada em fraudar licitações, superfaturar material de construções e desviar dinheiro público.
O Ministério Público Federal descobriu, e a Justiça vem concordando, que, por 15 anos, a secretaria responsável por melhorar a infraestrutura do estado – inclusas aí as obras para encostas na Região Serrana – foi transformada em um bunker arrecadador de propina, além de uma mina de dinheiro clandestino para campanha política do então PMDB.
No total, o desvio chegou a mais de R$ 4 bilhões, diz o Ministério Público Federal.
A corrupção era tão enraizada na pasta de Obras que havia lá uma porcentagem de propina própria, chamada “taxa de oxigênio”. Os procuradores descobriram que, além dos 5% que as empreiteiras pagavam ao ex-governador Sérgio Cabral, havia um pagamento a mais, de 1%, exclusivo para a secretaria.
Nos últimos anos, a secretaria de Obras teve três titulares presos e condenados: Hudson Braga, José Iran e Luiz Fernando Pezão.
E a tragédia da Região Serrana, em 2011, foi um marco no esquema criminoso, segundo os procuradores, com liberação de muitas obras em pouco tempo e, principalmente, em caráter emergencial – o que permite às autoridades contratar sem a licitação tradicional.
Foi nessa época, exatamente para recuperar a área, que, segundo a Lava Jato, o governo do estado convidou uma figura considerada central para a quadrilha, de acordo com o MPF: Affonso Henrique Monnerat, nomeado subsecretário extraordinário para a construção da Região Serrana.
De cara, Monnerat foi denunciado por improbidade administrativa. Segundo procuradores de Nova Friburgo, cidade também na Região Serrana, houve sobrepreço nos contratos para a reconstrução de pontes destruídas pelas chuvas.
As construtoras foram contratadas de forma fraudulenta, mediante o emprego de propostas comerciais inidôneas de outras empresas, apenas para dar cobertura aos preços praticados, segundo o MPF.
Os procuradores dizem que essa era “uma missão inicial”. Cumprida essa etapa, ele foi nomeado chefe de Gabinete da Secretaria de Governo, subordinado direto de Wilson Carlos, um dos líderes da organização criminosa, segundo o MPF.
As investigações mostram que, ao deixar a Secretaria de Estado de Obras, Monnerat “deixa de fazer jus às vantagens indevidas do órgão” e “passa a receber dinheiro em espécie”. Ou seja, ele mudou de uma caixinha de propina para outra.
Bilhetes apreendidos pelos investigadores contêm várias anotações com o nome Monnerat. No total, em 12 vezes os manuscritos registravam os valores “oriundos de propina” indo para os seus bolsos, somando cerca de R$ 300 mil, diz o MPF.
Depois da atuação na secretaria de Obras, Monnerat foi alçado ao segundo cargo mais importante do estado. Virou chefe da Secretaria de Governo, levado por seu antigo parceiro Luiz Fernando Pezão, que virara governador.
O que dizem os citados
O ex-governador Luiz Fernando Pezão negou qualquer tipo de irregularidade em sua gestão e disse que trabalhou incansavelmente na Região Serrana após a tragédia de 2011.
“Fui a primeira pessoa a chegar, fiquei lá 36 dias. Cheguei em Friburgo, foi aquele caos, fiquei 36 dias lá. Fazendo socorro, a limpeza, procurando corpos (…) A gente fez uma quantidade de obras enorme em toda a Região Serrana. Me orgulho muito do que a gente fez, do trabalho que a gente fez, da quantidade de encostas, de pontes (…) Eu duvido que algum empresário vai chegar para você e falar que eu pedi um centavo naquela reconstrução da serra”, disse ao g1.
Com o processo em segunda instância após recorrer da condenação pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, Pezão citou que os procuradores da Lava Jato no Rio que o denunciaram passam por um processo administrativo.
“Não vai ser esse pessoal do Ministério Público que vai apagar o que a gente fez. Eu estava lá com lama até o joelho (…) Fizemos mais de 60 encostras na Região Serrana. Até hoje, não me mostraram um centavo que apareceu na minha conta, um dinheiro que eu tenha depositado no exterior. Fui preso e até hoje eles não provaram um centavo nas minhas contas com a falsidade que eles criaram em cima de mim.”
Quando foi preso, Affonso Monnerat negou conhecer os fatos.
Os advogados de Hudson Braga não foram encontrados.
Fonte G1