O Altos Papos trouxe à tona mais um assunto polêmico, e que vem tomando conta de todos os noticiários a nível nacional: o uso do chamado “kit covid”, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e apoiadores, como tratamento precoce ao vírus. Composto por remédios como a Hidroxicloroquina e a Ivermectina, ele vem sido distribuído por diversos governos e prefeituras do país e por falta de comprovação de eficácia, a Associação Médica Brasileira resolveu não recomendar o composto. Ouvimos o Dr. Raimundo Paraná, médico hepatologista, membro da Sociedade Brasileira de Hepatologia e Dr. em medicina, além de ser professor titular da UFBA.
O médico avaliou a decisão como positiva. “Não existe essa história de ser contra ou a favor de tratamento, se este kit tivesse comprovação clara, qualquer médico usaria, não é questão política, isso não é medicina, nenhum médico que for sério, ele vai se opor a algo que tenha sustentabilidade cientifica. Medicina não é crença, quando se prescreve um medicamento, é preciso dizer que foi estudado, que reduz risco, mas também carrega risco, pois, não existe medicamento que não traga algum tipo de risco, por menor que seja. Se não tenho um estudo que comprove a eficácia, que me diga o benefício e malefício, não posso fazer o juízo crítico, e todos os estudos robustos foram contrários até então, os chamados ensaios clínicos controlados. A questão é simples, para prescrever você ÌÂÂprecisa ser claro e honesto com o seu paciente”, afirmou o Dr. Raimundo.
Ele ainda afirmou em entrevista, que o chamado “kit covid” não está em protocolo de nenhum hospital do mundo, e não pode ser chamado de kit de tratamento, pois não tem respaldo das principais autoridades médicas. “Estes remédios podem acarretar problemas sérios, foram testados em outras doenças, mas não é assim que funciona em medicina. A Aspirina, ela pode ser usada em doenças infecciosas, mas não pode na dengue, pois pode matar, isso é de evidência científica, mesma coisa é na covid, estes medicamentos são para doenças específicas. Um dos principais problemas da Cloroquina é no coração, a Ivermectina é indicada para seres humanos há mais de 20 anos, um vermífugo fantástico, acontece que nunca foi testado nas doses que está sendo utilizada, já vi pessoas tomando duas, três vezes por dia, por dois meses, três meses, quem estudou isso, quem comprovou? A toxicidade é baixa, mas nestas doses? Ninguém sabe. Quem inventou isso, não existe estudo, precisa estar padronizado, definido em estudos, ninguém sabe o tempo a dose, como usar, não é uma questão de birra, de contraditório, é científica”, disse o médico.
O hepatologista contou ainda que vê com tristeza, diversos colegas médicos, espalhados pelo país defendendo o uso do “kit covid”. “Não é um grupo grande, vi algumas manifestações e currículos, boa parte dos colegas nunca estudaram o assunto, isso acaba levando a ser considerada uma opinião pessoal, perigosa e terá impacto se ganhar espaço, o que me deixa assustado é como uma pessoa pode se colocar uma opinião pessoal contrária à de especialistas, altamente qualificados, acima da Fundação Oswaldo Cruz, da USP, da UFBA, da CDC dos Estados Unidos, que dita as regras da saúde mundial, com a agência europeia? As pessoas colocam a opinião acima, com que propriedade? ”, opinou.
Segundo o Dr. Raimundo Paraná, este é um problema médico e científico ao mesmo tempo. “90% dos pacientes que têm Covid se curam de uma doença leve, 10% vão precisar de UTI, o número de pessoas que precisam das UTIs por utilizarem estes kits é muito grande, o uso da Ivermectina, por exemplo, cresceu mais de 1800% do início da pandemia para cá, pior do que isso, acho que essa questão de discussão de que tomei e fiquei bom, não é assim, eu não faria, não tomaria e não tomei, a maioria dos médicos que conheço e no hospital que frequento não vejo ninguém fazer. Muito cuidado com isso, a facilidade do acesso à informação levou as pessoas a se descuidarem, aceitam qualquer coisa e fake news se tornam verdade, principalmente na área de saúde, é desastroso, assustador ver uma situação dessas no país neste momento”, concluiu.